quinta-feira, abril 19, 2012

Ouve-se sempre a distância numa voz

1.
(branco)
tudo é claro antes da palavra iniciar a sua sombra,
nós porém aprendemos a luz com a soletração
e não somos capazes de compreender outra claridade,


2.
(negro)
os passos vigiam a rua, enquanto o melro
tece o negro com as asas. Não mão, o abandono
desenha a sua luz: o segredo apaga-se
na pequena fractura do silêncio.

esqueço as palavras que te davam um rosto,
há assim uma mudez que é a nossa traição.
Descobrimo-lo tarde, depois de o jardim
se ter esvaziado e de só haver lucidez
para a minúcia do nosso abandono


3.
(cinzento)
nunca encontrarei o lugar, o teu, e o terror
volta-se para mim sem me reconhecer.
Até o terror


4.
(branco)
de todas as cores a mais subtil
chama-se cegueira: nome
que avança até se apagar

- Rui Nunes
in Telhados de Vidro, n.º6, Averno

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