segunda-feira, março 12, 2012

TRABALHOS DO POETA

[1949]


XIII

Faz uns anos, com pedrinhas, coisas largadas e galhos de árvores, edifiquei Tilantlán. Vem-me à memória a muralha, os portões amarelos com o signo digital, as ruas estreitas e malcheirosas habitadas por uma plebe ruidosa, o Palácio verde do Governo e a Casa vermelha dos Sacrifícios, aberta por uma mão, com os seus grandes templos e calçadas inumeráveis. Tilantlán, cidade cinzenta feita de pedra branca, cidade agarrada ao solo com unhas e dentes, cidade de pó e orações. Os seus moradores – astutos, cerimoniosos e coléricos – adoravam as Mãos que os haviam feito, mas temiam os Pés, que podiam destruí-los. A sua teologia e os sacrifícios infindáveis com que tentavam comprar o amor das Primeiras e assegurar a benevolência dos Últimos, não evitaram que uma alegre manhã o meu pé direito os esmagasse, com a sua história, a sua feroz aristocracia, os seus motins, a sua linguagem sagrada, as suas canções populares e o seu teatro ritual. E os seus sacerdotes jamais suspeitaram que Pés e Mãos não eram senão as extremidades de um mesmo deus.

- Octavio Paz
in Águila o sol?

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