terça-feira, novembro 15, 2011

Tríptico de Sônia Maria do Recife

I

Meu Santo Antônio de Itabira
ou de Apicucos
ensina-me um verso
que seja brando e fale de amanhecer
e se debruce à beira-rio
e pare na estrada
e converse com a menina
como se costuma conversar com formigas
besouros
folhas de cajueiro de ingazeiro de amendoeira
esses assuntos importantíssimos
que não adianta o rei escutar
porque não entende nossa linpim-guapá-gempém.

II

Meu Santo Antônio do Recife
preciso de outro verso bem diferente
mas tirado daquele como um jardim se tira da terra
e todo macio dourado
ágil fosforescente cantábile
para significar a moça
que pouco a pouco se formou ao sol do espelho
e agora está sorrindo
sobre a cordilheira de antepassados
e finca no olhar um ramo
de música, à maneira dos passarinhos.

III

E assim terei celebrado Sônia Maria
Sônia de som e sonho
sonata mozartiana que em modinha
brasileira se ensombra
e vai soar suavíssima no sono
Maria de Maria mariamente
ou de mar de canaviais mar murmurante
Sônia Maria do Recife
nesse ponto de luz tamisada
onde as meninas começam a transformar-se
em nuvem, e as mulheres
meditam sua grave adolescência.

- Carlos Drummond de Andrade

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