sexta-feira, setembro 16, 2011

Caricatura do atormentador de si mesmo

A Marcos Tramón

Que se passa comigo?
Estou doente, doente de mim mesmo.
Não sei antes, mas
desde que o mundo é mundo comigo
os dias são escuros, de tempestade
ou fustiga o sol sinistro.
Os outros dias,
os dias intermédios,
nem os sinto, são neutros, são esquecimento.
Pelas noites encho-me
da melancolia do nada,
a transbordar, como um cinema barato,
onde passam filmes sem ritmo,
sem acção, lentos e de pouco
talento, sem a graça
sequer do horrível.
A minha vida é um fracasso.
Senti a companhia
por vezes do verso e de uma qualquer
rapariga de quarenta
anos com propensão para os rapazes
propensos ao afecto de uma mãe.
Agora as senhoras
foram-se, é natural pois, dizia,
gostam dos jovens indefesos
e falhos de afecto, mas evitam
os rostos lacerados.
E com elas, pelas mesmas razões,

fugiu a poesia
com a sua música para outra parte.
Eu continuo condenado pela vida
e só, ou pior, pois não estou só,
estou comigo.

- Marcos Tramón
(tradução de Joaquim Manuel Magalhães)
in Poesia Espanhola, Anos 90, Relógio d'Água

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