sexta-feira, agosto 26, 2011

Os amorosos

Os amorosos calam.
O amor é o silêncio mais fino,
o mais temeroso, o mais insuportável.
Os amorosos buscam,
os amorosos são os que abandonam,
são os que mudam, os que esquecem.
O coração lhes diz que nunca hão-de encontrar,
não encontram, procuram.

Os amorosos andam como loucos
porque estão sós, sós, sós,
entregando-se, dando-se a cada instante,
chorando porque não salvam o amor.
Preocupa-os o amor. Os amorosos
vivem dia a dia, não podem fazer mais, não sabem.
Sempre estão a ir-se,
sempre, para algum lado.
Esperam,
não esperam nada, mas esperam.
Sabem que nunca hão-de encontrar.
O amor é a prorrogação perpétua,
sempre o passo seguinte, mais um, mais um.
Os amorosos são os insaciáveis,
os que sempre – que bom! – hão-de estar sós.

Os amorosos são a hidra do conto.
Têm serpentes no lugar de braços.
As veias do pescoço incham-lhes
também como serpentes para asfixiá-los.
Os amorosos não podem dormir
porque se dormem os vermes vão comê-los.

Na escuridão abrem os olhos
e neles cai o espanto.

Encontram lacraus debaixo do lençol
e a cama flutua-lhes como por sobre um lago.

Os amorosos são loucos, só loucos,
sem Deus e sem diabo.

Os amorosos saem das suas covas
trémulos, famintos,
à caça dos fantasmas.

Riem-se da gente que sabe tudo,
a que ama a perpetuidade, veridicamente,
da que acredita no amor como em lâmpada de azeite
inesgotável.

Os amorosos brincam a apanhar água,
a tatuar o fumo, a não partirem.
Jogam o longo, o triste jogo do amor.
Ninguém há-de resignar-se.
Dizem que ninguém há-de resignar-se.
Os amorosos envergonham-se de toda a conformação.

Vazios, mas vazios de uma costela a outra,
a morte fermenta-lhes por detrás dos olhos,
e eles caminham, choram até à madrugada
em que comboios e galos se despedem dolorosamente.

Chega-lhes por vezes um cheiro a terra recém-nascida,
a mulheres que dormem com a mão no sexo, satisfeitas,
a riachos de água carinhosa e a cozinhas.
Os amorosos põe-se a cantar entre lábios
uma canção não aprendida.
E vão-se chorando, chorando,
a formosa vida.

- Jaime Sabines
(tradução de Vasco Graça Moura)
in Os Amorosos e outros poemas, Quetzal

1 comentário:

Alexia04 disse...

Te agradezco muchísimo esta magnífica traducción del que considero el poema mas apasionado que se haya escrito en lengua castellana (o, al menos, que yo haya leído).

Has hecho posible que pueda compartirlo con mis amigos de habla portuguesa, pues de otro modo, resultaría muy complicado de sentir en mi idioma.

Sinceramente, gracias.