sexta-feira, outubro 01, 2010

Sal no balcão

É mais elástica a vantagem da fraqueza.

Quando a flor do castanheiro se incendeia
Viro costas
E obedeço à escuridão dos choupos verticais.

É nas conversas que vou tendo com o pintor.

É por causa dessa linguagem, desse saber de rua,
Dos horários dos homens do lixo.
É por causa dessas coisas que tiro o chapéu
Ao bolso deformado
E ajeito a cabeça.

Só depois dos Eléctricos, vejo o que fiz.
Guardo este receio de não ter um rosto
Capaz de receber um homem
Ainda mais miserável,
Eternamente vil, escondido na obscura evidência do choupal.

Os artesãos fazem cadeiras em vime
E os merceeiros foram esmagados por nós,
Por causa de um lugar de estacionamento
E filhos mal paridos, e velhas que chegaram à cidade
Com essa cor de sovaco.

Eternamente gloriosa, essa profissão de vender arroz
E mel. Alimentou retratos de família.
Até construiu um espaço de galinhas
Poedeiras e coelhos sem remela.

À conta das lojas,
E dos intermediários
Esperei por uma encomenda
Que nunca chegou (isto é já
a minha cabeça de poeta. Não encomendei coisa alguma. Era só para dar um certo romantismo à farinha maizena).

Mas havia sal
Na madeira do balcão.
Vê-se na foto
E na mulher que chegava
Nesse preciso momento
À mercearia.

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