domingo, outubro 24, 2010

Bar Velho

Lembras-te do número do quarto?
Ficava no prédio da rua cinzenta.
Havia uma garrafa de scotch na mesinha de cabeceira
E da janela viam-se os atacadores de sapatos grossos
E arma em punho.

É engraçado - o rapazinho parecia um pateta
Que ralava os nervos, de minuto a minuto
Porque tinha saído da escola e não gostava desses
Modos pedagógicos da permanente dos 40 anos.

Foi simpático ter vindo cumprimentar-me
À cidade, onde fui estudante míope
De fórmulas escritas
E de noites sem dormir,
Por causa da dispensa de favores
Em lençois manchados da calculada carícia
E da nobre solidão da luz do gasómetro.
Pois foi.

Estive muito tempo por outras paragens.
Apaixonei-me por uma mulher
Que colocava a hipótese de não gostar de mim
E depois gostei do marido.
Pelo menos, apanhei um táxi
E rasguei o fato de corte turco
Ao dar meia volta à minha vida
Fugindo dessa guerra onde se fecha suavemente os olhos.

Depois andei por aí
Na meiguice do vento e das tabernas,
Onde se aprende as coisas da terra.

Eu gostava da vida.
E as coisas passavam em filme
Nos vagos movimentos
Da película calada desses primórdios.

Vai um copo de vinho, leitor?
Perguntava o bibliotecário das lunetas.

Vai sim, meu amigo.

Deixe-me fechar o livro.

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