domingo, setembro 26, 2010

Cadáver

A rádio acaba de informar-nos
da morte de Octavio Paz;
o chato de serviço puxa da coroa de louros
e pelos ditirambos post mortem da praxe.
E cita -diz ele- o grande poeta
quando afirma
que «os tempos têm limitado
o espaço da poesia»; e que isso
é sinal de como vão mal.

Não. Não é, gostava de responder-lhe,
é sinal apenas do mesmo de sempre:
os poetas -velhos, novos, mortos, vivos,
dá no mesmo-
nunca fizeram a mais pálida ideia
do que se passa à sua volta.

Mas não posso fazê-lo.
E de qualquer modo, quem me escutaria?
A fanfarra funerária já se pôs em marcha
-implacável, obscena, atroadora-
e até que se ache
diante do próximo cadáver
nem Deus poderá pará-la.

- Roger Wolfe
in Días sin pan (antologia)

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