o desejo de morrer
de infundir calma
no meu espantoso ofício de escrever
para pôr em som o quanto calo
e a quem não responde perguntar
Com o sangue de Deus na crista
eu sei que sou um galo
Esta é a minha mão das palavras
Sua-me em português a mão
Já me sangra de golpear em vão
Meter alguém as cabras
no curral por ser humano
de uma só mão
Se fosse mudo gritaria
mudo de espanto
Já me não resta pranto
nesta mão a minha
E se quer alguém o meu ofício
de mutismo e grito
que me arranque pela raiz
Deus e a caneta que é o mesmo
Deixaram-me ferido
os cantos e os credos
Agonizo aqui limpo de pecado
muito amei e chorei demasiado
suspeitando dos meus dedos
- Carlos Edmundo de Ory
(tradução de Herberto Helder)
in Doze nós numa corda, Assírio & Alvim
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