quarta-feira, junho 23, 2010

CAFÉ DE SUBÚRBIO (11)

Percebo logo que me reconhece
(Do teatro? Da TV? Ou do jornal?):
A popularidade, quanta vez, envilece
E rouba a paz do natural!

Então, actor, represento
O papel do poeta que o mundo tem de cor:
Doseio no olhar o sentimento,
Fecho o punho sob o queixo, à pensador.
(Só falta o falso alheamento
Do desfolhar da flor!)

Ridículo, decerto! Uns instantes passados,
Não sei gesticular, mudo de posição,
Todos os termos me parecem rebuscados,
Todo o tem, elevado em demasia, ou vão.

O melhor é sair. O actor que há em mim
Fica sem a ovação, na descida do pano.
Mas o poeta encontra, assim, o fim
Mais feliz e humano.

- António Manuel Couto Viana
As escadas não têm degraus, nº4
(Cotovia, 1991)


retirado daqui

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