Para Pedro Tamen
O baloiço não oleado que range
e duplica, sem infância remota
nem criança dentro, o canto
do pássaro invernal que teima,
nas altas latitudes temperadas,
despertar-me às cinco da manhã.
Vem do mais fundo da noite
lembrar-me que o dia será duro
e o sono vão, instila uma angústia
difusa nos lençóis, onde o corpo
no cansaço de ser se esvai
e demora entre náusea e torpor,
enquanto a máquina de chilrear
busca romper paredes,
trazer os claustros de Fevereiro
para dentro de casa (aninhar
nos ouvidos a verruma do bico):
contagiando com a ferrugem do canto
a querela dos traços na ramagem,
chama-se de volta à escravidão
do tempo a sua voz de hematite,
o seu apito de fábrica, diz-me
que a sorte do dia a decidiu
este som de hélices ou rolamento
de esferas na hora fria e deserta,
o meu capataz, o meu pássaro
metalúrgico, feitor da madrugada.
- Paulo Teixeira
in O Anel do Poço, Caminho
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