domingo, março 28, 2010

Um rio seco é como a alma

Um rio seco é como a alma
De um poeta que não pode escrever, embora conheça
Quase perfeitamente o tema e as mágoas
Da morte ressequida pelo estio. Mas o que queria,
E foi outrora um mar do mais puro cristal
Recua, torna-se sombrio como arbustos amoniacais, como
___________as folhas antigas do amor,
E abandona o pensamento. Não imagina
Nada que o possa substituir: só no pólo
Da memória oscila uma absurda bússola.
Por isso o rio, entre as lamentáveis árvores sombrias,
É uma agonia de pedras, de horrores submersos
Agora revelados, descoloridos. Por isso existem estas,
Estas pedras, estas ninharias
Quando o rio é uma estrada e a mente um vazio.


- Malcolm Lowry
(tradução de José Agostinho Baptista)
in As cantinas e outros poemas do álcool e do mar, Assírio & Alvim

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