(para alguém que faria anos hoje)
*
todo o lirismo é coisa de vime
coisa de fome
ladeada coisa de ânforas em mãos
como tu fazias
toda a homofonia é coisa contrária
é sempre o declive mineral
das portas
e depois a,
a boca sitiada de neve
como se fosse oleiro estelar por desmesura
com o nome o corpo pedaço negro
inteiro em volta
do som o credo
os nomes são coisas minerais
coisas que nunca se
dizem, sem
as imagens dizem melhor o centro do odor
o sabor da pele
ao meio do peito
escrevo os teus olhos
sei que a semente é
mais estéril dentro
do leite
sei que mão prepara por cima da boca a monda
dos canteiros
*
outrora já dizias-me
o olor das oliveiras em flor
e ouvia campos nevados
em torno da cerca do peito
e pensava em rios
na inocente caligrafia dos anjos
lavrados sobre muros
e gravava na casca das árvores
o que soçobrava de uma tarde
inteira de silêncio
*
sei que há asas mãos leitos que dizem
como me fazes inteiro e denso
ao meio dos olhos
sobre o poço de enxofre do verão
a roldana de dálias um rosto
que se semeia em canteiros nevados
*
já não te dou um nome ou
digo um rosto água diversa do nome das fontes
agora
é de noite e alguém
segura na mão por cima do cesto de vime
alguém retém também
a inocência cercada no rosto
e nos búzios a incandescência do perfume
é alguém que sabe a cal
respira a sombra dos olhos
nos trilhos
dos animais
alguém que sabe
alguém que me faz
os rumos obsoletos em dias
mitológicos cor de ouro cor de vime
alguém que me segreda à refeição
a trança cor de azeite
alguém que me diz tudo o que não posso ouvir
e as vozes nos jardins à chuva
alguém me faz homófono de
dedo fenda ferida
coisa aberta de lábios em casas
alguém que me faz
canção que conduz ao centro
homófono de certeza
(junto ao peito)
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