domingo, março 07, 2010

*

(para alguém que faria anos hoje)


*

todo o lirismo é coisa de vime
coisa de fome

ladeada coisa de ânforas em mãos

como tu fazias


toda a homofonia é coisa contrária


é sempre o declive mineral
das portas
e depois a,
a boca sitiada de neve

como se fosse oleiro estelar por desmesura

com o nome o corpo pedaço negro
inteiro em volta


do som o credo

os nomes são coisas minerais
coisas que nunca se
dizem, sem



as imagens dizem melhor o centro do odor

o sabor da pele

ao meio do peito

escrevo os teus olhos
sei que a semente é
mais estéril dentro
do leite

sei que mão prepara por cima da boca a monda
dos canteiros


*

outrora já dizias-me
o olor das oliveiras em flor
e ouvia campos nevados
em torno da cerca do peito

e pensava em rios

na inocente caligrafia dos anjos
lavrados sobre muros

e gravava na casca das árvores
o que soçobrava de uma tarde

inteira de silêncio


*

sei que há asas mãos leitos que dizem
como me fazes inteiro e denso
ao meio dos olhos

sobre o poço de enxofre do verão

a roldana de dálias um rosto
que se semeia em canteiros nevados


*

já não te dou um nome ou

digo um rosto água diversa do nome das fontes


agora
é de noite e alguém

segura na mão por cima do cesto de vime

alguém retém também

a inocência cercada no rosto

e nos búzios a incandescência do perfume


é alguém que sabe a cal
respira a sombra dos olhos
nos trilhos

dos animais

alguém que sabe
alguém que me faz

os rumos obsoletos em dias
mitológicos cor de ouro cor de vime
alguém que me segreda à refeição
a trança cor de azeite

alguém que me diz tudo o que não posso ouvir


e as vozes nos jardins à chuva


alguém me faz homófono de
dedo fenda ferida
coisa aberta de lábios em casas

alguém que me faz
canção que conduz ao centro

homófono de certeza
(junto ao peito)

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