segunda-feira, janeiro 19, 2009

Recordando Inês

Estavas, linda Inês, posta em sossego,
com a tua cabeça de astro incandescente
exposta ao apetite dos meus
antepassados – assassinos e curiosos
(perdoe-se a repetição) –, cujos braços foram
serpentes encantadas pelo furor nocturno.
Tão linda – e tão magra – Inês, lendo nas
cartas de ausência do teu amado a luz dos
teus sonhos vertidos dentro dos sonhos de outros.

Estavas posta em sossego nas mais lentas
páginas da História de Portugal à procura
de um lenço adequado ao teu vestido verde.
E deram-te o fogo, deram-te sangue, carne
e unhas, para seres humana afinal de contas e
crescer nas costas do teu amante, como ilha
envolta nos seus próprios mistérios
e contornos: quando a amada mora no corpo
do amante é nas suas próprias costas
que lhe crescem as asas.

Linda Inês, sentir o coração fora do corpo
nunca mais foi recordado como coisa
grega e antiga, usada para explicar
a ausência de vida no tenro fruto de um
jovem adorado nas margens do Eurotas.
Não esperes sentada, sossegada,
este amor foi feito de sangue e,
ainda por cima, a pedido de quem
quis sacudir dos teus ossos o peso
da morte impressa.

Sem comentários: