Vou chegar tarde para jantar.
Perderam-me os rumores do mar
e as gaivotas debruçadas sobre a
formação das ondas, com a curiosidade
contabilística de quem procura
calcular os danos e as perdas através
de crustáceos, pequenos peixes
e – com alguma sorte – um sargo.
Helena, outrora princesa de Tróia,
renunciou ao trono faz já algum tempo
e ao seu título de mulher mais bela
à face da terra. Contudo, tem ainda
boas pernas, que a ajudam a percorrer
largas distâncias e a mais alguma coisa.
Agora responde por Madame Helena,
só Helena ou apenas Lena,
tudo depende de quanto se pagar.
Mas não permitas ser eu quem te fale
de beleza. O belo é assunto para os jovens
e perdido está já o tempo de Tróia,
o meu tempo. Virá talvez Electra e
depois outras que por nomes gregos
já nem serão conhecidas.
Vou chegar tarde para jantar,
o mais provável é mesmo não chegar.
Tenho ouvido atentamente o canto das sereias
e até apostava que algumas cantam para mim,
talvez porque o estranho me impressiona,
me deslumbra, ou talvez seja só porque
atravessei os caminhos do Inferno, como
Orfeu, mas regressei sem ter aprendido a cantar.
Diz a Penélope, tua mãe e minha amada
esposa, tudo quanto te conto, apenas não
lhe digas isto: prefiro a fuga, meu filho,
tanto às sereias, como ao amor.
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