domingo, julho 01, 2007

A letra que invejava a nota

É tão triste não saber tocar piano, nem guitarra, nem sequer a harmónica
é tão triste não saber tocar um instrumento, não poder fazer música e deixar
a imaginação procurar o que faríamos daquele assobio que vem de dentro de nós.
Porque as palavras nem nos melhores dias conseguem ser notas musicais
e mesmo quando a frase se solta com todo o entusiasmo de dentro de nós, não
a frase não consegue alcançar o sino da emoção, ela não chega lá, a frase, o verso
um poema inteiro escrito mesmo com sangue não consegue atar uma alma
e empurrá-la para o precípicio onde as pessoas endoidecem e dançam a noite toda

Estou aqui no meu quarto em frente a vocês, toco no teclado, consigo isto
o meu irmão no quarto aqui ao lado tem a guitarra de flamenco no colo
os dedos dele divertem-se nas cordas, sem parar, sem pensar, sem medos
e encontram aquelas notas que qualquer ouvido entende, qualquer um aprecia
Eu não consegui trancar-me no quarto, ele sim, usou os anos, dedicou-se ao silêncio
de dentro do silêncio foi puxando sons estranhos e agora o tempo já canta, há música

Se eu pudesse fazer música com duas notas ou três, quem sabe até com 23, 23 notas
tantas notas como as letras do meu teclado... mas não posso, isto não é um piano
daqui não se consegue a música que nos interrompe o silêncio, daqui nós só esperamos
pelo dia em que alguém se cruze com estas notas de silêncio e as entenda e adapte
para letras de uma música de fundo que toque por um momento enquanto há vida.

Sem comentários: