quinta-feira, agosto 10, 2006

Aleixo só...


Quadras soltas do poeta da minha terra de Loulé, António Aleixo...

Ontem rei, hoje sem trono,
Cá ando outra vez na rua;
Entreguei o fato ao dono
E a miséria continua.

Há luta por mil doutrinas.
Se querem que o mundo ande,
Façam das mil pequeninas
Uma só doutrina grande.

Vós que lá do vosso império
Prometeis um mundo novo
Lembrai-vos que pode o povo
Q'rer um mundo novo a sério.

Se pedir, peço cantando,
Sou mais atendido assim,
Porque, se pedir chorando,
Ninguém tem pena de mim.

Quem prende a água que corre
É por si próprio enganado;
O ribeirinho não morre,
Vai correr por outro lado.

Uma mosca sem valor,
Pousa co'a mesma alegria
Na careca de um doutor
Como em qualquer porcaria.

A pedra branca, polida,
Que mói o trigo, indif'rente,
É como a roda da vida
Que mói a vida da gente.

Sei que pareço um ladrão,
Mas há muitos que eu conheço,
Que, não parecendo o que são,
São aquilo que eu pareço.

Quem trabalha e mata a fome
Não come o pão de ninguém;
Quem não ganha o pão que come
Come sempre o pão de alguém.

O homem sonha acordado,
Sonhando a vida percorre
E deste sonho dourado
Só acorda quando morre.

Ris de mim, mas eu de ti
Não me sei rir, nem preciso;
Quem tem juízo não ri
Dos que não têm juízo.

Embora os meus olhos sejam
Os mais pequenos do mundo,
O que importa é que eles vejam
O que os homens são no fundo.

Até nas quadras que faço
Aos podres que o mundo tem,
Sinto que sou um pedaço
Do mesmo podre também.

O mundo só pode ser
Melhor do que até aqui,
Quando consigas fazer
Mais p'los outros que por ti.

1 comentário:

Eu* disse...

LIndo poema! lindo mesmo!
vc está de parabéns pelo excelente bom gosto!
bjs!